A utopia de desenvolvimento sustentável

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Até que ponto um país em desenvolvimento como Moçambique, tem capacidade para atingir o prognosticado como Objectivos de Desenvolvimento Sustentável?

in:  Preâmbulo da Agenda de 2030 para Desenvolvimento sustentável

“Esta Agenda é um plano de acção para as pessoas, o planeta e para a prosperidade. E também busca fortalecer a paz universal com mais liberdade. Reconhecemos que a erradicação da pobreza em todas as suas formas e dimensões, incluindo a pobreza extrema, é o maior desafio global e um requisito indispensável para o desenvolvimento sustentável.

Todos os países e todas as partes interessadas, actuando em parceria colaborativa, implementarão este plano. Estamos decididos a libertar a raça humana da tirania da pobreza e da penúria e a curar e proteger o nosso planeta. Estamos determinados a tomar as medidas corajosas e transformadoras que são urgentemente necessárias para mudar o mundo para um caminho sustentável e resiliente. Ao embarcarmos nesta jornada colectiva, comprometemo-nos que ninguém seja deixado para trás”.

No extrato acima exposto, muitos perguntas, podem ser levantados. Como seria possivel uma paz universal num mundo em que as guerras cada vez mais se intensificam? Como seria possível erradicar a pobreza num mundo cheio de capitalistas e corruptos? Como seria possível curar e proteger o planeta se as emissões de gases com efeitos na estufa, continuam a ser emitadas sob um olhar impávido das Nações mais ricas?

Portanto, há mais dúvidas que imperam do que optimismo de se alcançar esse desejo, de um mundo universalmente desenvolvido.

Hora, o que pretendo nesta reflexão, é olhar Moçambique analisando a sua capacidade de alcançar os objectivos globais.

Mas antes, importa clarificar alguns conceitos como desenvolvimento, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável.

desenvolvimento é um processo de mudança de uma sociedade no sentido de melhorar o bem-estar da população de geração em geração, alargando o seu leque de escolha nos domínios da saúde, educação e rendimento e expandindo as suas liberdades e possibilidades de participação significativa na sociedade[1].

Sustentabilidade, envolve atender às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as futuras gerações também satisfazerem suas necessidade.

O princípio da sustentabilidade compreende as componentes ambientais, económicas, sociais e culturais.

 “Para que se chegue a um estado de sustentabilidade é necessário que o desenvolvimento de um país possibilite ao meio ambiente, uma forma de recuperá-lo das acções do homem, e também que as futuras tecnologias não o prejudiquem de nenhuma forma, seja ela poluição visual, do ar, dos rios e etc. Esse desenvolvimento também deve permitir uma melhor integração das pessoas, de forma a diminuir a exclusão social, mas não necessariamente um desenvolvimento no sentido de um novo produto industrial, mas da formação de uma nova mentalidade. E finalmente, ele deve propiciar o avanço cientifico e tecnológico aos países que o adotarem, pois caso ele seja um retrocesso tecnológico, nunca será implantado com sucesso”[2]

Assim, entenderia-se o desenvolvimento sustentável como: “O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração actual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidade[3]”. Significa possibilitar que as pessoas agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e económico e de realização humana e cultural, fazendo ao mesmo tempo um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitats naturais.

Resumindo: Desenvolvimento sustentável deve ser entendido como algo economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente correcto.

O desiderato de desenvolvimento sustentável, deve desencadea-se em 17 objectivos a saber:

Objectivo 1. Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares

Objectivo 2. Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável

Objectivo 3. Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades

Objectivo 4. Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos

Objectivo 5. Alcançar a igualdade de género e empoderar todas as mulheres e raparigas

Objectivo 6. Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos

Objectivo 7. Assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todos

Objectivo 8. Promover o crescimento económico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos

Objectivo 9. Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação 19

Objectivo 10. Reduzir a desigualdade dentro e entre os países

Objectivo 11. Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis

Objectivo 12. Assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis

Objectivo 13. Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos (*)

Objectivo 14. Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável

Objectivo 15. Proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda da biodiversidade

Objectivo 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis

Objectivo 17. Fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável 


Para este contexto, a análise, é centralizada em 5 Objectivos:

OBJECTIVO 1: “Acabar com a pobreza[4] em todas as suas formas, em todos os lugares”

De acordo com o relatório de Progresso Nacional sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio de 2010, 54,7% da população moçambicana vive abaixo do limiar nacional de pobreza e, estatísticas mais actualizadas do IOF[5] 2014-2015, referem que  a incidência de pobreza situa-se em 49,2%.

Embora as tendências históricas em termos percentuais (como ilustra o gráfico 01), mostrem um declínio da incidência de pobreza, em termos da realidade actual, a prevalência da pobreza ainda é elevada em todo o país, cacterizada pela inadequação do consumo e de acesso a quase todos os serviços básicos tais como saúde, educação, agua e saneamento entre outros

Além disso, as famílias estão vulneráveis a vários riscos (cheias, inundações, ciclones, seca) e os riscos causados pelo aumento da epidemia do HIV / SIDA que suscita um elevado número de óbitos na primeira infância e de crianças que ficam órfãs.

A pobreza em Moçambique, é causada pelo isolamento, infra-estrutura inadequada e a consequente falta de acesso a bens e serviços onde, nas áreas rurais de Moçambique, a rede de estradas encontra-se em situação muito precária e os serviços básicos são inadequados[6].

Gráfico 01-Evolução da incidência da pobreza em Moçambique

Fonte de dados: INE

Considerando a taxa de incidência de pobreza mais actualizada do IOF 2014-2015, mais de 9 milhões de Moçambicanos, vivem na pobreza.

As estatísticas do gráfico 01, mostram-nos que a incidência de pobreza desceu em 10,3 de 1997 para 2003; subiu em 0,6 de 2002 para 2009 e voltou a descer em 5,5% de 2009 para 2015, como pode se observar no gráfico 02.

Olhando para essa tendência de decréscimo da incidência da pobreza, o país não conseguirá se livrar da pobreza até 2030, ano do término para o alcance desses objectivos como preconiza o documento de ODS.

Senão vejamos as duas possibilidades[7] que se seguem, determinadas com base na experiência do passado. Por mais que se considere a possibilidade de se registar um decréscimo da incidência da pobreza num período de 7 anos de 10,3 % como se observou de 1997-2003, o país não alcançará 0% até 2030 pois, até 2022 a taxa se situaria em 38%; em 2029 em 28,6% e em 2030 em 27,2%.

Já apossibilidade 2 da média de 5,5% verificada de 2009 a 2015, o país registaria uma incidência de 43,7% em 2022; 38, 2 em 2029 e 37,4% em 2030, como pode se ler na Tabela 01 em resumo.

Tabela 01-Possibilidades de redução da incidência da pobreza em Moçambique até 2030

Períodos2016-20222023-20292029-2030
Intervalo de possibilidade (%)1[8]] 49,2 – 38 [] 38 – 28,6 [] 28,6 – 26,8 [
Intervalo de possibilidae (%) 2[9]] 49,2 – 43,7 [] 43,7 – 38, 2 [] 38,2 – 37,2 [

Gráfico 02- Possibilidades percentuais de redução da incidência da pobreza em Moçambique até 2030

Assim, pode-se concluir que é uma utopia pensar-se que vai se cumprir com o Primeiro Objectivo de Desenvolvimento sustentável em Moçambique ate 2030: “Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares”.

OBJECTIVO 2: “Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável

Fome

Dados de 2015, referem que, em Moçambique, cerca de 24% da população moçambicana vive em situação de fome. Em 25 anos, a prevalência da fome em Moçambique diminuiu de 56% para 24% da população. Se em 25 anos diminuiu em 32%, em 15 anos isto é, até 2030 o que será?Terá sido erradicada?

Nutrição

A mal nutrição em Moçambique estimada a partir dos dados do IOF08, revela que a nível nacional, 46.4% das crianças com menos de 60 meses estão atrofiadas (desnutrição crónica moderada), 18.7% têm insuficiência de peso e 6.6% sofrem de marasmo (desnutrição aguda). A incidência da desnutrição crónica severa é de 23%. Pode se observar a evolução da desnutrição e peso na imagem 01.

Imagem 01 – Evolução da desnutrição crónica, insuficiência de peso e desnutrição aguda em Moçambique (incidência em % de crianças com menos de 5 anos de idade)

      Fontes: MPD/DNEAP usando dados IAF96, DHS03, MICS08 e IOF08.

Se em 2003, a desnutrição  crónica situava-se em 47,1 em 2009 situou-se em 46,4. Portanto, em 7 anos baixou, 0.7% uma média anual de redução de 0,1. Olhando nessa tendência e se for permanente, até 2030, situar-se-á em 44. 2%.

A desnutrição aguda, de 2003 para 2009, baixou em  1% considerando a análise do MICS e subiu em 1,1 considerando os dados do IOF 2008/9. Considerando os primeiros dados da MICS que falam de descida no período 2003-2008, até 2030 provavelmente Moçambique terá uma taxa de 0% de incidência.

Quanto a insuficiência de peso, considerando uma taxa de redução de 1, 5 ou 2,6 verificado no período 2003-2008, de acordo com análises do IOF e MICS respectivamente , o país não conseguirá atingir casos zero até 2030 pois a este ritmo nesse ano as taxas poderão se situar em mais ou menos 8%.

Pode se observar na Tabela 02, as possibilidades de incidência de desnutrição e peso em Moçambique até 2030, considerando a manutenção das taxas de redução registadas de 2003 a 2008.

 Tabela 02-Resumo das possibilidades de incidência da desnutrição e peso.

Tipo de situação2016-20222023-20292029-2030
Taxa de Desnutrição crónica (%)45.74544.9
Taxa de Desnutrição aguda  (%)000
Taxa de Insuficiência de peso (%)16.714.714.4

 Fonte: elaborada pelo autor

Assim, até 2030 Moçambique só tem possibilidade de erradicar a desnutrição aguda permanecendo o desafio quanto a crónica e insuficiência de poso.

Objectivo 3Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar[10] para todos, em todas as idades

Em  relação a este objectivo, vai se olhar a partir de várias perspectivas descritivas da situação da saúde existentes sobre Moçambique pois não existe um instrumento guia que uniformiza a informação para facilitar a análise. Olhemos a situação descrita pelos IOF.

Dados do IOF 2014-15 indicam que 68,3 da população do país, tem acesso físico aos serviço de saúde ou seja, percorrem até 30 min para encontrar um hospital. Esta percentagem representa uma evolução comparativamente aos dados de 2009 em que o acesso atingia 66,4%.

Imagem 02-Percentagem de acesso a serviços de saúde

Fonte: IOF 2008-2009

Se de 2009 para 2015 a taxa de acesso só subiu 1,9% portanto, para 2030 caso esse ritmo se mantenha, poderá apenas atingir 74,2%. Isto significa que haverá um número considerável de população sem acesso a cuidados de saúde e consequentemente sem vida saudável.

Particularmente a mortalidade, a taxa em menores de cinco anos, em 1997 era de 219 mortes em cada mil nados vivos, contra 97 reflectidos nos dados de 2011.

No que se refere à taxa de mortalidade infantil o país contava no mesmo período 135 mortes em cada mil habitantes mas agora os registos apontam para 64 óbitos por cada mil nados vivos.

A situação geral da saúde em Moçambique, particularmente a crianças, é descrita pela UNICEF-Moçambique no texto extraído da sua página da Internet e disponível em http://www.unicef.org.mz/nosso-trabalho/o-trabalho-do-unicef/health/

in UNICEF-Mozambique

Embora Moçambique tenha registado um progresso sustentável na redução da mortalidade em menores de cinco anos, acima de 28.000 das mais de 950.000 crianças nascidas todos os anos morrem durante os primeiros 28 dias. As mortes neo-natais representam mais de 30% das mortes de crianças menores de cinco anos.

Inquéritos nacionais sucessivos desde finais da década de 90 mostraram uma tendência decrescente contínua, que acelerou a partir de 2008, caindo para 97 mortes de crianças por 1.000 nados vivos…..”.

Infelizmente, o progresso na redução da mortalidade dos recém-nascidos tem sido muito mais lento. Vários factores tanto do lado da oferta como da procura contribuíram, de forma persistente, para este progresso mais lento; a assistência de pessoal qualificado durante o parto ainda é reduzido, uma vez que aproximadamente 40% das mulheres grávidas dão à luz em casa; a qualidade dos serviços obstétricos e neonatais nas unidades sanitárias é baixa; e verifica-se um baixo nível de conhecimento e existem barreiras culturais às práticas salutares durante a gravidez, parto e cuidados pós-parto.

A nível de prestação de serviços de saúde, os maiores constrangimentos dizem respeito ao baixo número de unidades sanitárias; elas são insuficientes para permitir o acesso conveniente das mães grávidas aos serviços de maternidades.

Esta situação é agravada pela má qualidade da infra-estrutura, falta de equipamento e disponibilidade irregular de produtos e medicamentos em muitas unidades sanitárias. Além disso, existe uma força de trabalho insuficiente na área da saúde para fazer face à procura dos serviços, e questões como a motivação pessoal, retenção e competências do pessoal são também os principais determinantes da qualidade dos serviços.

Portanto, perante as situações acima descritas, torna-se difícil prever que em Moçambique até 2030, estará já se assegurada uma vida saudável e promovida o bem-estar para todos, em todas as idadescomo prevê o terceiro objectivo. O optimismo existe mas a realidade mostra que a probabilidade de se atingir é reduzida.

Objectivo 4Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos

A situação da educação em Moçambique,é igualmente analisada na sua generalidade pela UNICEF-Moçambique no extracto que se segue  que pode ser acedida através do http://www.unicef.org.mz/nosso-trabalho/o-trabalho-do-unicef/educacao/

in UNICEF-Mozambique

Tem havido melhorias significativas na educação em Moçambique. A abolição das propinas escolares em 2003/04, a prestação de apoio directo às escolas e a distribuição de livros escolares gratuitos, juntamente com investimentos na construção de salas de aula e em professores são acções que resultaram num aumento do número de ingressos no ensino primário e secundário, que passou de 3,6 milhões em 2003 para cerca de 6,7 milhões em 2014.

Os ingressos no ensino primário situam-se actualmente em 97%. A admissão de crianças de 6 anos de idade tem melhorado significativamente até mais de 80%. A paridade de género nos ingressos no ensino primário e secundário também melhorou.

No entanto, muitos desafios subsistem no ensino básico em Moçambique. As taxas de conclusão do ensino primário, mesmo que tenham aumentado rapidamente a partir de uma base baixa numa fase inicial, têm registado uma estagnação em cerca de 47% ao longo dos últimos anos devido às elevadas taxas persistentes de abandono escolar e repetição.

Um estudo realizado pela UNESCO em 2012 estima que aproximadamente 1,2 milhões (ou 23%) de crianças em idade do ensino primário e secundário estão fora da escola; destas, 775.000 são crianças em idade do ensino primário e quase 55% são raparigas.

 O estudo destaca os factores relacionados com a pobreza e normas socioculturais que impedem as crianças de terminar os estudos, tais como o casamento prematuro e a gravidez precoce, bem como a distância de casa até à escola, a falta de espaços escolares seguros, salas de aula superlotadas e a inexistência de um número adequado de professores de qualidade.

Embora tenha havido construção em grande escala ao longo dos últimos anos, a uma taxa de 1.450 salas de aula por ano, 45% das salas de aula das escolas primárias ainda estão em condições precárias. E apesar de o Governo contratar milhares de novos professores por ano (em 2013, o governo contratou mais de 8.000 professores – a maioria para as escolas primárias), o rácio professor / aluno nas classes iniciais do ensino primário ainda é elevado, situando-se em 1:63 e registam-se disparidades geográficas significativas na colocação dos professores.

O fraco aproveitamento nas escolas primárias de Moçambique é também motivo de grande preocupação. Uma avaliação nacional do aproveitamento escolar constatou que, em média, menos de uma em cada dez crianças da terceira classe tem competências básicas de leitura.

O estudo nacional indicou que existem ligações entre o baixo nível de aprendizagem e questões essenciais, tais como o absentismo dos professores, a capacidade dos professores, a gestão escolar, o uso do português como língua de instrução e ambientes de aprendizagem pouco propícios. Além disso, apenas 4 por cento das crianças com menos de 6 anos, principalmente nas zonas urbanas, têm acesso a qualquer tipo de oportunidades de aprendizagem precoce financiadas pelo Estado, o que muitas vezes significa que as crianças não estão prontas para a escola, contribuindo para o baixo nível de aprendizagem e o abandono escolar.

Uma reflexão complementar sobre a situação da Educação em Moçambique, pode se ler no extracto tirado do artigo de opinião deste mesmo autor com o título “O sistema educativo moçambicano, está desnorteado do foco”, disponível emhttps://apsaber.blogspot.com/2017/05/o-sistema-educativo-mocambicano-esta.html em que passamos a citar partes deles.

In: apsaber.blogspot.com

“…. Se a educação tem por objectivo formar “pessoas” para saber como conhecimento, saber fazer, como habilidades e saber ser e estar como afectividade no que Benjamim S. Bloom chama de domínios educativos, no contexto Moçambicano nem uma nem outra coisa se evidencia.

O sistema educativo actual, é mudo que não se enquadra em nenhuma das dimensões acima citadas. Forma-se jovens habilitados em nada aliás, August Cury na sua obra intitulada “Código de inteligência” ja diz que “o sistema educativo do mundo tem por objectivo preparar alunos para o mercado e não para a vida e no fundo não prepara para nenhum dos espaços”.

“…os nossos alunos de agora, terminam nível básico, médio até superior sem conhecimento muito menos habilidades para não falar do saber ser e estar. São jovens, futuro do país que não sabem o que sabem e nem sabem o que não sabem.

Associado ao défice do conhecimento, têm deficit de habilidades afectivas, não sabem respeitar o próximo, não tem carisma, são poucos senão nada generosos, não tem compaixão, não tem capacidade de suportar tensões, pressões, intempéries, adversidades. São jovens dominados pelo egoísmo, individualismo, consumidos pelo espírito de competição pelo sucesso/fama a qualquer custo, de ganhar dinheiro sem sacrifícios, dominados pelo imediatismo, em suma, são jovens que tem deficit de decifrar aquilo que August Cury chama de códigos de inteligência.[11]

As crianças e os adolescentes da actualidade, são agitados, ansiosos, insatisfeitos, especialistas em reclamar, não têm paciência, querem tudo na hora, se fica dez minutos sem fazer nada se estressa”, enfatiza Cury.

A ausência da afectividade num indivíduo tem consequências imensuráveis. Pode ser um bom profissional, bom aluno etc em termos de conhecimentos de como gerir uma empresa, de saber assimilar o que aprendeu, mas se não sabe estar, respeitar, conviver, comportar-se com  os demais, está condenado ao fracasso.

Portanto, o conhecimento, as habilidades e a efectividade são elementos importantes que devem estar alicerçados num indivíduo e a educação tem o dever de garantir isso mas não é o que acontece.

Jovem de actualidade, vai a escola para satisfazer os pais ou seja, ele como indivíduo não vê a importância de ir a escola, vai a escola e não sabe porquê.

Já dizia o psiquiatra anteriormente referido que” o último lugar em que os alunos querem estar é na escola”. Segundo esse autor, o excesso de informação, o excesso de estímulos visuais e sonoros advidos da TV, e de estímulos proveniente dos computadores, Internet, video games, são responsáveis por esse desinteresse, até pode ser sobretudo na cidade e no campo, onde há dificuldades de acesso a essas plataformas?

Certas ou não essas evidências, a realidade moçambicana é de que a educação (onde a escola como “entidade reguladora”, os país, a sociedade em geral devem ser agentes activos do processo e por isso cada um tem a sua responsabilidade) está falhar no concernente ao seu papel.

Há um desvio padrão maior entre o ideal e o real. Há quem diga que desde a altura em que a ONU definiu a educação como um direito de acesso universal ou seja,”todo mundo” tem de ir a escola a todo custo, é onde começa o erro.

Provavelmente seja por aqui onde por exemplo em Moçambique começa-se a se introduzir “passagens automáticas” (um modelo mal interpretado) como forma de descongestionar as turmas e garantir a absorção de novos alunos para assegurar o alcance do almejado direito de acesso universal á educação formal.

Verdade ou não, o facto é que de algum tempo para cá, temos um sistema educativo desnorteado do foco. Algo deve ser feito pois, como diz o ditado, “Investir em educação é investir no futuro”.

Hora, é uma farsa falar desse objectivo em Moçambique particularmente em qualidade de Educação. As crianças, adolescentes e jovens que fazem ensino Primário e Secundário na actualidade, na sua maioria não sabem ler nem escrever, pressupostos básicos para se falar em qualidade, como se referiu no extracto acima exposto.

Objectivo 6. Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos

A reflexão sobre este objectivo, está centrada no extracto tirado da UNICEF-Moçambique disponível em http://www.unicef.org.mz/nosso-trabalho/o-trabalho-do-unicef/water-sanitation-hygiene/

in UNICEF, Mozambique

Embora o acesso à água potável, saneamento e higiene (ASH) seja o cerne do desenvolvimento económico e social sustentável de uma nação, Moçambique está aquém de atingir as metas do Objectivo de Desenvolvimento do Milénio referentes ao acesso à água potável e saneamento básico.

Desde 1990, a cobertura total do saneamento aumentou para 21%, mas a disparidade entre a cobertura nas zonas urbanas e rurais continua grande: 44% nas zonas urbanas vs. 11% nas zonas rurais. 40% das pessoas ainda praticam a defecação a céu aberto, tendo diminuído de 66% em 1990. A falta de saneamento melhorado custa a Moçambique cerca de 4 biliões de Meticais por ano devido às mortes prematuras, custos médicos e perdas de produtividade.

A cobertura do abastecimento de água potável é baixa, situando-se em 49%, com uma grande disparidade entre a cobertura urbana (80%) e a cobertura rural (35%). O desafio de melhorar as condições de ASH nas pequenas cidades/vilas é enorme; elas representam cerca de 15% da população urbana de Moçambique, quase 2 milhões de pessoas. Embora estas vilas sejam estratégicas para o desenvolvimento, os serviços de abastecimento de água potável e saneamento ficaram muito para trás nos investimentos em grandes cidades, ou até nas zonas rurais circundantes.

As unidades sanitárias e escolas são instituições cruciais para a sobrevivência e o desenvolvimento das crianças, mas infelizmente elas são caracterizadas por níveis inadequados de abastecimento de água potável e saneamento. Apenas uma estimativa de 40% das escolas rurais têm instalações de ASH para alunos e professores

Esses pressupostos e outros, fazem me crer que atingir os propósitos de desenvolvimento sustentável em Moçambique, é uma miragem. De que forma podemos falar da necessidade de uso sustentável de recursos para um contexto em que a população depende desses recursos para a sua sobrevivência? Por exemplo, o recurso terra em Moçambique, é explorado por mais de 80% da população que dela depende para o sustento das famílias, como poderia se introduzir a sustentabilidade nesse contexto?

Portanto o conceito de desenvolvimento sustentável, não deve ser universal para todos os territórios pois da mesma forma que pobreza é um conceito relativo[12]desenvolvimento sustentável também devia pois o nível de necessidades de um país Europeu ou Americano é totalmente diferente com o de um africano.

Este, é um aspecto que ironicamente a própria Agenda 2030 reconhece ao afirmar-se que:

“Reconhecemos que existem diferentes abordagens, visões, modelos e ferramentas disponíveis para cada país, de acordo com suas circunstâncias e prioridades nacionais, para alcançar o desenvolvimento sustentável…”.

Agenda 2030

O que essencialmente sugiro, é que os objectivos de Desenvolvimento sustentável sejam diferenciados ou seja, que se delinea estratégias e metas enquadrados com a realidade dos países. Por exemplo, erradicar a pobreza e fome em África até 2030, é uma ilusão pois, há uma série de factores por se considerar: Crescimento demográfico, corrupção etc.

Portanto, existe uma necessidade de estabelecer-se objectivos direccionados a países pobres como Moçambique em que o ritmo do seu alcance, seja acordo com a realidade. Atingir os actuais objectivos de desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento não deve ser considerada ser possível sendo o ritmo e a forma, universais para com os países desenvolvidos.

Vejamos que, a diferença que existe no nível de desenvolvimento dos países faz existir ao nível da realidade, uma interpretação dicotómica do conceito de desenvolvimento sustentável pela parte de políticos, académicos, sociedade civil etc (o que a própria Agenda reconhece). Não creio que as entidades anteriormente mencionadas interpretem-o da mesma forma sobretudo os políticos, da forma pelo qual a ONU o entende.

A tónica dos discursos políticos de governantes moçambicanos, tem se centrado no uso sustentável dos recursos mas, no meu entendimento tem sido feita uma interpretação diferente do preconizado, basta se olhar na forma de actuação.

Por exemplo: Se diz haver necessidade de uso sustentável de recursos florestais, para a população que neles encontra a subsistência, tem que criar condições de desenvolver actividades paralelas para quebrar a dependência. Da mesma forma que, deve-se criar condições para que o corte da madeira e abate da fauna não seja tão desusada como acontece agora sobretudo com estrangeiros. Sem nenhuma acção a respeito, seria apenas uma vontade e não prática. Devem haver acções concretas e realísticas do contexto para que se garanta o dito uso sustentável dos recursos.

Trazer uma abordagem sobre Objectivos de desenvolvimento sustentável para Moçambique relegando aspectos relacionados ao crescimento demográfico, corrupção, situação da pobreza, do desenvolvimento económico, desastres naturais, doenças (malária, HIV) etc, seria fazer perspectivas utópicas desenquadradas no contexto espacial.

Olhando na componente demográfica, pode se ler a realidade de Moçambique nos gráficos que se seguem.

Mais do que traçar-se objectivos universais que deverão ser atingidos até 2030, há uma necessidade de se olhar na realidade dos países, em termos de capacidades e vontades sobretudo políticas.

Como diz Balestrini (2013), no seu texto intitulado  “Ensaio – a farsa do desenvolvimento sustentável”,

“as ideias sobre desenvolvimento sustentável se baseiam na tentativa de tornar o mundo um lugar melhor, contudo, elas se esquecem de que para uma ideia entrar em pratica ela tem de ser realista. Apesar de sermos todos  diferentes, seja pelo ponto de vista, pela cor, raça, forma de pensar, andar ou vestir, no fundo, todos querem a mesma coisa: paz, alegria, um lar, um ambiente gostoso, ser bem sucedido e etc. Logo, ninguém destrói o meio ambiente porque quer, ninguém passa fome porque gosta nem sai matando seus semelhantes à toa por ai. Ou seja, preservar o planeta é algo que todos querem, e se encontrar uma solução para os problemas ambientais ou outros problemas fosse tão simples e rápida, por mais estranho que pareça, mas ela já teria sido implementada. Dessa forma, encontrar uma saída para o mundo, não é simplesmente juntar tudo o que falta e falar que se deve conseguir aquilo”( Balestrini, 2013).

Portanto falar de Desenvolvimento sustentável em Moçambique nos moldes actuais, é uma simples questão de capricho e não objectivo alcançável.


[1] Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento-PNUD (2013). Relatório do Desenvolvimento Humano 2013: A ascensão do sul, progresso humano num mundo diversificado. Nova York.

[2] BALESTRINI, Bruno Piovesan (2013). Ensaio – a farsa do desenvolvimento sustentável. Ciências Do Ambiente – UNICAMP Estudos.

[3] ONU

[4] Crespo e Gurovitz (2002) “É fome, é falta de abrigo. Pobreza é estar doente e não poder ir ao médico. Pobreza é não poder ir à escola e não saber ler. Pobreza é não ter emprego, é temer o futuro, é viver um dia de cada vez. Pobreza é perder o seu filho para uma doença trazida pela água não tratada. Pobreza é falta de poder, falta de representação e liberdade”

[5] Inquerito de Orcamento familiar

[6] Fundo Internacional Para o Desenvolvimento Agrário-FIDA (2010). Habilitar os pobres rurais a superar a pobreza em Moçambique. Roma.

[7] Considerando válidas e constantes as percentagens de diminuição registadas nos anos 1996-2002 e 2008-2014

[8] Redução da incidência da pobreza em 10,3% em cada 6 anos

[9] Redução da incidência da pobreza em 5,5% em cada 6 anos

[10] Forton (1974) citado por Nogueira (2002) acrescenta como componentes do bem-estar social educação, saúde, alimentação, habitação, comunicação, trabalho, previdência social, lazer, possibilidade de associação e integração cultural e liberdades humanas.

§          [11] CURY, August (…). O Código de Inteligência. Rio de Janeiro

[12] A pobreza difere também em cada país, região, sociedade em que estão inseridos os indivíduos, ou seja, o que é pobreza para Moçambique pode não ser para outro país também subdesenvolvido (Maleane, 2010).

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